Juíza é demitida por repetir sentenças em mais de 2 mil processos
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul concluiu que ela usou decisão padrão, sem análise individualizada dos casos, para aumentar produtividade
14/07/2025 15:40 por Maira kempf

A juíza Angélica Chamon Layoun, 39 anos, foi demitida pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul sob acusação de fraudar decisões judiciais. Ela teria emitido despachos padrões sobre casos cíveis e usado elas para dar sentenças idênticas em cerca de 2 mil processos, sem análise individualizada. Conforme o Processo Administrativo Disciplinar (PAD) que resultou na demissão da magistrada, o objetivo desse "copia e cola" era aumentar a produtividade.
A demissão foi assinada semana passada pelo desembargador Alberto Delgado Neto, presidente do TJ-RS. A medida foi tomada pelo Órgão Especial do TJ-RS em fevereiro e confirmada em maio deste ano, quando o processo administrativo disciplinar (PAD) transitou em julgado.
A magistrada foi empossada em julho de 2022 como substituta na comarca de Cachoeira do Sul (RS), mas já estava afastada desde setembro de 2023, devido à apuração disciplinar. Ela foi demitida porque ainda estava em estágio probatório, ou seja, ainda não gozava da vitaliciedade que garante que um juiz só pode perder o cargo em decorrência de sentença judicial transitada em julgado.
O PAD aponta também que Angélica teria desarquivado processos já julgados para despachar sentenças idênticas e, com isso, computar "novos julgamentos". Ela também responde a uma ação penal, movida pelo Ministério Público.
A demissão é a pena mais grave imposta a um magistrado, segundo o artigo 42 da Lei Orgânica da Magistratura (Loman). Raramente ela é aplicada. As sanções, quase sempre, ficam entre advertência, censura, remoção, disponibilidade e aposentadoria compulsória — quando o juiz é afastado de vez, mas recebendo vencimentos proporcionais ao tempo de serviço.
Angélica começou a carreira jurídica em Pernambuco, onde foi juíza por quase seis anos. Após ser aprovada em um novo concurso no Rio Grande do Sul, mudou-se para o território rio-grandense. No concurso da magistratura gaúcha, ela chegou a ser reprovada na prova de sentença, mas recorreu contra a decisão, via mandado de segurança, alegando que não haviam sido apresentados os critérios utilizados para a sua reprovação. O Superior Tribunal de Justiça anulou a prova dela e a autorizou a fazer novo exame, no qual ela foi aprovada. Ela assumiu a titularidade da 2ª Vara Cível da Comarca de Cachoeira do Sul, região central do Estado.
Quando Angélica tinha apenas um ano na função, a Corregedoria-Geral de Justiça do Tribunal do Rio Grande do Sul recebeu denúncias de que a juíza teria proferido "despachos em massa, idênticos, em inúmeros processos em curso naquela unidade judicial". Ela foi afastada dois meses após o início das investigações e agora veio o desfecho do caso, na fase administrativa.
Contraponto
O que diz a defesa da juíza Angélica Chamon Layoun:
A reportagem tenta contato com os defensores da magistrada. Após o resultado do Processo Administrativo Disciplinar, o advogado dela, Nilson de Oliveira Rodrigues, ajuizou um pedido de revisão disciplinar no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para discutir a proporcionalidade da punição e vícios de instrução do processo disciplinar. Ele considerou a demissão "desproporcional, juridicamente viciada e carente de prova de dolo ou má-fé, elementos indispensáveis à configuração de falta funcional gravíssima".
Conforme o defensor de Angélica, a magistrada foi designada para uma vara cível que estava há anos sem juiz titular, com grande passivo processual e sem rotinas estruturadas. "Nesse cenário, buscou corrigir falhas operacionais, reordenar o fluxo processual e promover melhorias administrativas, enfrentando resistências internas que acabaram servindo de catalisador para o processo disciplinar".
GZH
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