Advogado Jean Severo vira réu por organização criminosa e lavagem de dinheiro
Segundo o Ministério Público, ele era responsável por repassar ordens de preso isolado no sistema federal; criminalista nega e se diz "perseguido"
31/08/2023 15:08 por redação
O advogado Jean de Menezes Severo é um dos 24 denunciados pelo Ministério Público em uma investigação de organização criminosa e lavagem de dinheiro relacionada a uma facção. O advogado, que ficou conhecido por atuação em júris de repercussão, como no do menino Bernardo, em Três Passos, e no da boate Kiss, é apontado como membro de segundo escalão de uma organização com base no Vale do Sinos. Ele se diz perseguido pela Polícia Civil e Ministério Público por sua atuação nestes casos.
— Eu fui acusado disso por rasgar livro de promotor e por dizer que o delegado de polícia em júri era mentiroso, covarde. Tudo que está descrito na denúncia é uma grande mentira e facilmente será demonstrado pela defesa — sustentou Severo.
A denúncia foi enviada no dia 22 de agosto e aceita na íntegra pela 2ª Vara Estadual de Processo e Julgamento dos Crimes de Organização Criminosa e Lavagem de Dinheiro, que transformou os denunciados em réus. A peça, com 108 páginas, tem como base inquérito da Delegacia de Polícia de Repressão ao Crime de Lavagem de Dinheiro. O nome do advogado surgiu ainda na investigação da Polícia Civil, que cumpriu mandado de busca e apreensão na casa dele em 2019.
Conforme denúncia, o advogado "ultrapassou os limites da defesa dos interesses dos clientes e das responsabilidades da advocacia para a adesão à prática de crimes". Ele seria, conforme o documento, homem de confiança de Antônio Marco Braga Campos, o Chapolin, líder do grupo criminoso e isolado na Penitenciária Federal de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul.
Como no sistema federal não há acesso a celulares e as visitas são restritas, Jean era um dos poucos autorizados a ter contato com Chapolin, que passou a adotar também o apelido de Menino. O advogado alega que esteve menos de cinco vezes no local e sempre o via no parlatório — como prevê a regra do regime federal.
— No Presídio Federal não tem como passar mensagem. Qualquer acadêmico de Direito já sabe. Toda a conversa que tu tens com interno é gravada todo tempo. Então assim: se ele (agente) entende que tu tá passando um código, a conversa, o parlatório é suspenso In limine (imediatamente), então isso não existe como — alega o advogado.
Os dados que deram origem à investigação foram extraídos do celular de um dos denunciados, que seria o braço direito de Chapolin e que recebeu as ordens de como proceder quando ele fosse transferido. São quase 90 gigabytes de dados, conversas, áudios e mensagens. Em uma delas, Chapolin diz ao seu braço direito que Jean Severo seria alguém que estaria no comando, conforme consta na denúncia do MP.
Trecho da denúncia do Ministério PúblicoMinistério Público do Rio Grande do Sul / Reprodução
O Ministério Público encaminhou a investigação também para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que afirmou que, assim que for intimada, vai abrir procedimento no Tribunal de Ética e Disciplina.
Lavagem de dinheiro
Conforme a denúncia, o grupo usava contas de laranjas para passagem de dinheiro, geralmente com depósitos fracionados, em dinheiro vivo e com valores inferiores a R$ 10 mil. Isso porque depósitos de quantias superiores são informados pelas instituições financeiras para o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), unidade de inteligência financeira do governo federal que atua principalmente na prevenção e no combate à lavagem de dinheiro.
Receptação
Pelo crime de receptação, foram denunciados três dos 24: Chapolin, seu sucessor na organização e Jean Severo. Conforme a denúncia, os dois primeiros teriam adquirido um veículo roubado, com placas clonadas. O carro é avaliado em cerca de R$ 144 mil.
Jean teria usado o carro, sendo inclusive flagrado em câmeras de um pedágio, no banco do carona do veículo. Em cumprimento de mandado de busca e apreensão na casa dele, a Polícia Civil encontrou a chave de um carro da mesma marca, que foi enviada para Alemanha para análise da montadora. Essa análise apontou que a chave era de outro carro, diferente daquele que Severo foi flagrado dentro.
— Nunca, essa chave não tem nada a ver com processos, é uma invencionice da polícia e cretinice da polícia. Não tem nada a ver, não existe, eu nunca andei nesse carro aí da Mercedes. A única vez que eu andei um carro desse tipo foi para me levarem da rodoviária ao Fórum. Eu nunca tive esse carro — diz Jean.
O delegado Márcio Niederauer, que comandou as investigações, ressalta, em nota, que "a conclusão do inquérito policial baseia-se em provas técnicas, pautadas em diversos elementos colhidos ao longo da investigação". E acrescenta: "Não por acaso, os indiciados foram denunciados pelo Ministério Público, em denúncia assinada por três Promotores de Justiça, e a denúncia foi recebida pelo Poder Judiciário".
Severo foi flagrado dentro de carro que seria roubado. Advogado diz que pegou carona até o FórumMinistério Público do Rio Grande do Sul / Reprodução
Organização do grupo
Na denúncia, é descrita como ocorre a organização do grupo criminoso e explicado o envolvimento de cada um dos denunciados. Além de membros da facção que já estão presos, há ainda presença de empresários e de outras pessoas apontadas como laranjas, uma delas uma bacharel em Direito.
Os membros seriam divididos em quatro escalões:
- O primeiro escalão seria ocupado apenas por Chapolin.
- No segundo escalão estariam membros de apoio direto, confiança e gestão financeira. Neste grupo, além de Jean Severo, estariam dois homens responsáveis pela logística de drogas e armas, duas mulheres com quem Chapolin se relacionou e a companheira de outro homem desse núcleo.
- O terceiro escalão seria composto por líderes comércio irregular de cigarros, jogo de bicho e jogos de azar.
- O quarto escalão seria formado por membros apontados pelo MP como "mão de obra da organização": responsáveis pela venda de drogas, executores de transações financeiras e responsáveis por contas laranjas.
Gaúcha ZH
Os comentários são de inteira responsabilidade de seus autores e não representam a opinião deste site. Se achar algo que viole os termos de uso, denuncie.